VOTAR É O ÚNICO TRABALHO DE UM CIDADÃO? SE HÁ OUTROS, QUAIS SÃO ELES? QUEM DECIDE, QUEM VAI FAZER ESTES OUTROS TRABALHOS – E COMO ELES DEVERÃO SER FEITOS?
Por Douglas Schuler
Estive pesquisando e ensinando o conceito de inteligência cívica há mais de 15 anos e ele pode nos ajudar a entender como as decisões nas sociedades democráticas são feitas e, mais importante, como poderiam ser feitas no futuro. Por exemplo, eu e meus alunos usamos a inteligência cívica como foco para realizar a comparação entre faculdades e universidades. Queríamos ver o quão bem as escolas ajudaram a educar seus alunos para o engajamento cívico e inovação social, e quão bem as mesmas apoiaram este trabalho dentro da comunidade em geral. Meus alunos também praticavam inteligência cívica, como a melhor maneira de aprender, isto é, por meio de projetos do “mundo real”, como o desenvolvimento de um jardim comunitário em uma escola para jovens infratores. Então, o que é inteligência cívica? E por que isso importa?
ENTENDENDO A INTELIGÊNCIA CÍVICA
A inteligência cívica descreve o que acontece quando as pessoas trabalham em conjunto para resolver os problemas de forma eficiente e equitativamente. É um conceito amplo que mostra como as mudanças acontecem positivamente, podendo ser aplicado em qualquer lugar e assumindo também muitas formas.
Por exemplo, a inteligência cívica é vista na prática quando representantes de governos do mundo criaram e aprovaram por unanimidade um plano de ação global para o meio ambiente no ano passado, em Paris. Embora a mudança climática continua sendo uma imensa ameaça, essa cooperação global - envolvendo anos de debate e discussões acerca do assunto – produziu um quadro comum de ação para a redução mundial de gases do efeito estufa. A inteligência cívica acontece quando as pessoas trabalham em conjunto para resolver os problemas. Outro exemplo, é o de prefeitos em todo o mundo estabelecendo redes, como o Parlamento Mundial de Prefeitos, para trazer os eleitos juntos em uma base regular, a fim de discutir questões enfrentadas pelas cidades, tais como habitação, transporte e qualidade do ar. Uma dessas redes, C40 Cities Climate Leadership Group, foi lançada quando representantes das 40 maiores cidades do mundo queriam colaborar para enfrentar a mudança climática. Da mesma forma, milhões de pesquisadores, professores, artistas, outros indivíduos e organizações não governamentais em todo o mundo, estão trabalhando para melhorar as suas cidades e comunidades.
INTELIGÊNCIA CÍVICA HOJE
Existem abordagens mais acadêmicas e contemporâneas que incluem:
• A pesquisa do sociólogo Xavier de Souza Briggs sobre como as pessoas do mundo têm integrado os esforços da sociedade civil, organizações de base e do governo para criar comunidades sustentáveis; • Com uma visão ligeiramente diferente, o pesquisador Jason Corburn analisou como as pessoas “comuns”, em bairros economicamente desfavorecidos, têm utilizado a “Street Science” para entender e reduzir doenças e degradação ambiental em suas comunidades; • Elinor Ostrom, recentemente premiado com o Prêmio Nobel de Economia, estudou como grupos de pessoas de várias épocas e lugares “managed resources”, tais como bancos de pesca, bosques e pastagens, trabalham em conjunto para preservar fontes dos meios de vida para gerações futuras.
INTELIGÊNCIA CÍVICA DO SÉCULO XXI
As aulas de educação cívica devem ir muito além de ensinar processos políticos convencionais, mas praticar e ensinar o auto-governo, buscar formas do indivíduo participar ativamente de todos os processos que constroem a sociedade Em um nível básico, “governar” já acontece quando grupos de moradores, organizações sem fins lucrativos ou alguns amigos se reúnem para ajudar a resolver uma preocupação comum. Este trabalho pode assumir muitas formas, incluindo a escrita, desenvolvimento de sites, organização de eventos ou manifestações, reivindicações, participação em organizações e, até mesmo, realização de tarefas inclusive que seriam consideradas como “postos de trabalho para o governo”. Às vezes, atuar na governança de uma sociedade pode significar até mesmo quebrar algumas regras, possivelmente levando a reformas de longo alcance. Por exemplo, sem a desobediência civil, os EUA ainda poderia ser uma colônia britânica e os afro-americanos ainda poderiam ser forçados a andar na parte de trás do ônibus. Como uma disciplina, inteligência cívica fornece um foco amplo que incorpora ideias e descobertas de muitos campos de estudo. Trata-se de envolver pessoas de todas as esferas, diferentes culturas e contextos. Um foco em inteligência cívica, principalmente, nas instituições de ensino, poderia levar diretamente para o engajamento social. E isto nos ajudaria diretamente a equacionar os grandes desafios que temos que enfrentar hoje e no futuro.
DOUGLAS SCHULER – Membro do Conselho do Evergreen State College – Whashington – EUA. Pesquisa e trabalha com Inteligencia Cívica, em várias partes do mundo há 40 anos, possuindo vários livros publicados sobre o tema.
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